domingo, agosto 16, 2009

Superfície

Algum tempo atrás ele não teria feito isso, concluiu. Ele sentia desprezo, na maior parte do tempo, as pessoas simplesmente irritavam ele. Ele não gostava das palavras, da voz, dos assuntos... não gostava de ter de parecer interessado ou forçar um interesse e simpatia que não tinha. Sobre tudo, ele odiava ser tocado, as pessoas tinham a péssima mania de encostar...

Ele entendia o porque seu desgosto era retribuído tão normalmente, ele era uma pessoa fácil de se odiar. Arrogante, sarcástico, fechado, distante e manipulador eram apenas algumas de suas qualidades menos admiráveis, e ele tinha uma grande lista delas. Isso, no geral, se devia ao fato de não saber, e não querer, tolerar a mesquinhez e ignorância, atributos indispensáveis a grande massa. Somando isso a sua sinceridade fria, insensibilidade para alguns, podia-se concluir sem esforço que ele podia contar nos dedos de uma mão suas amizades.

Porem ele havia se deixado experimentar uma tolerância maior, tentou ignorar mais e julgar menos. Este foi apenas mais um de seus erros, ele sabia agora. Alguns meses foram suficientes para que ele achasse que tinha agido como um tolo, havia se deixado levar, odiava isso. Odiava não se reconhecer em cada uma de suas atitudes, palavras, gestos...


- E não havia sido assim antes? - Perguntou a si mesmo num sussurro.


Ele sabia que sim. Havia, durante muito tempo, cedido muito de sua essência em troca de nada. Se deixou levar e pagou o preço. Odiava arrepender-se das coisas, ele lamentava e arrependia-se muito pouco.


- Tolice... - Admoestou-se e respirou fundo limpando a mente... Deixou a música trazer sentimentos, sensações e tragou do seu cigarro.


Como poucas excecões, a música era uma das poucas coisas capaz de fazê-lo sentir-se plenamente bem, por vezes muito mal, mas sempre fazia-o sentir algo. Sempre havia música, se não em seus ouvidos, ao menos em sua mente. As excecões, raras como a palavra indica, sempre o deixavam fascinando em algum nível. Para ele era fácil divisar estas pessoas, qualquer um capaz de não irrita-lo ou entediá-lo, capaz de causar afeição ou ainda qualquer um capaz de ver alem do que havia em sua superfície, era certamente uma rara exceção.

Essas pessoas eram sempre capazes de lhe clarear os pensamentos, faziam-no sorrir sinceramente e isso acontecia pouco. Mais notável era o fato destas pessoas conseguirem fazê-lo se importar com algo, ele geralmente se importava com poucas coisas, menos ainda com outras pessoas.

No geral as pessoas que tentavam rotulá-lo, e elas quase sempre faziam isso, definiam-no como uma pessoa infeliz. Ele mesmo achou por um tempo que era infeliz, agora o motivo disso se fazia óbvio, abriu mão do que não tinha preço, pelo que não valia o esforço.

Sorriu satisfeito, era ele mesmo novamente. Sentia-se novamente capaz de queimar como o inferno e mesmo assim manter a calma, talvez fosse um pouco mais frio, um pouco mais sombrio, mas isso o deixava satisfeito. Ele tinha mais motivos do que precisava para estar satisfeito, sobretudo por que a tempestade era incessante, convicta, essencialmente bela, poética... não era apenas uma tempestade, era a essência da paixão e da inevitabilidade.

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